terça-feira, 19 de junho de 2012

Conflito em Antioquia. Paulo e Pedro: dois partidos em oposição – Gl 2.11-21


SÁBADO, 6 DE AGOSTO DE 2011


A perícope estudada neste post encerra o bloco 1.18-2.21, que podemos denominar de narrativo ou histórico, uma vez que descreve situações vividas por Paulo logo após ter recebidoo chamado de Jesus Cristo. Hans Dieter Betz (Galatians, Hermeneia, p. 16, 103-104), inclusive, inclue 2.10-14 dentro da narratio, que na organização retórica é o segmento reponsável por apresentar a contextualização do tema da carta.

Não entrarei na questão abordada pelo Júlio em sua última mensagem, uma vez que minha ideia é apresentar o texto bíblico de forma panorâmica e contextual, enfatizando os conflitos nele presentes.

Se no texto anterior, segundo minha interpretação, Paulo pretende demonstrar aos seus opositores e às igrejas da Galácia que seu ministério, dirigido aos gentios (incircuncisos), foi reconhecido pelos apóstolos e líderes de Jerusalém, nesta perícope ele vai mais longe.

Na perícope anterior foram formalizados dois ministérios: o paulino aos incircuncisos e o petrino aos circuncidados. Agora Paulo deseja demonstrar que, além disso, sua autoridade apostólica lhe dá condições até para confrontar o apóstolo Pedro. Qual o objetivo? Possivelmente dar um recado indireto àqueles que o julgam e criticam. Algo como: se tenho autoridade para repreender Pedro, certamente tenho autoridade, direito e coragem para confrontá-los também!

Do ponto de vista estrutural, o texto pode ser dividido em um enunciado central seguido por dois blocos. O enunciado está no v. 11, onde Paulo sumariza o que desenvolverá nos versículos seguintes: A afirmação de que Pedro tornou-se repreensível quando esteve em Antioquia. 

O primeiro bloco, de caráter narrativo (2.11-14), contextualiza a repreensão. Em sua visita aos cristãos gentios de Antioquia, Pedro sentiu-se bem, inclusive comendo com eles, o que era uma demonstração de comunhão e aceitação mútua. No entanto, diante da chegada de pessoas ligadas a Tiago, Pedro mudou de atitude provavelmente temeroso de ser repreendido por eles em função de suas posturas radicais diante das leis veterotestamentárias.

A situação foi tão séria que chegou a influenciar Barnabé, discipulador e posteriormente companheiro de Paulo. Diante de quadro tão sério, o apóstolo julgou ser necessário falar seriamente com Pedro.

A partir desse ponto estamos no segundo bloco, que é discursivo (2.15-21). Nele Paulo relata as palavras que dirigiu a Pedro (v. 15-17) e sua própria reflexão (v. 18-21). Isso é perceptível pelo uso do pronome da primeira pessoa no plural – “nós” – na primeira parte, e do pronome da primeira pessoa no singular – “eu” – na segunda parte. 

Como Júlio desenvolveu de modo mais detalhado aspectos exegéticos e teológicos desta perícope, quero destacar apenas alguns elementos contextuais. O primeiro, como já disse, é a estratégia paulina de explicitar o confronto com Pedro para validar sua própria autonomia. Não há aqui uma questão apenas individual. Paulo tem consciência de que ele e Pedro representam dois grupos de cristãos. Aquilo que fizerem terá repercussão para a vida dessas pessoas. Portanto, Paulo tem muito cuidado com o que faz e age com consciência. 

Paulo centraliza a discussão no “evangelho” (v. 14), como já fizera anteriormente. Obviamente, é o evangelho segundo a concepção paulina que se coloca como critério para a discussão. Em que consiste ele? Em salvar, quem quer que seja, pela fé, e não somente isso, em introduzir os salvos a uma vida de fé. Pedro, ao deixar-se influenciar pelos judaizantes, abandona esse preceito. A crítica de Paulo faz muito sentido, afinal, diz, se ele e Pedro, judeus, têm consciência de que só podem viver uma vida pela fé e pela graça, nunca pela lei, como submeter os gentios salvos aos critérios da lei do AT?

Um outro elemento que desejo ressaltar é a fala biográfica de Paulo. Depois da repreensão ele expressa em que crê e como vive. Ele fundamenta cristologicamente sua vida. A lei, que os judeus cristãos tanto enfatizam, levou Paulo à morte, morte queo torna imune à própria lei. Morte também com Cristo, para que ressurja para uma vida com Cristo. E, além disso, uma vida em que Jesus vive nele. Central para tudo isso é a fé. 

Ao falar desse modo, Paulo deixa o aspecto negativo da discussão com Pedro para enfatizar o postivo: sua vida como modelo de existência sob a graça e vivida a partir da fé em Jesus. 

Termino com uma pequena reflexão. Lendo este texto, não posso deixar de perguntar: que tipo de vida nós, cristãos brasileiros, estamos vivendo? Infelizmente, minha conclusão é que estamos mais próximos de Pedro, dos cristãos judeus e dos judaizantes do que de Paulo e das comunidades gentílicas. Nossa vida depende mais da lei do que da graça. Pense em quantas normas e leis são apresentadas como centrais para os cristãos contemporâneos e tire sua própria conclusão.

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